"a-maior-função-do-homem-no-mundo-é-transformar-se-em--literatura" - Reinaldo Santos Neves

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

Entrevistando Contemporâneos & Independentes: Latinidades & Representatividade - Brendda Neves

 


"Não gaste seu dinheiro fazendo cursos para ser escritor, gaste comprando livros primeiro.

Brendda neves

Como a literatura entrou em sua vida? 

Brendda: Minha mãe lia para os três filhos à noite e sempre comprava livros para nós.

Qual foi o papel da leitura para a construção do seu eu autor(a)? 

Brendda: A leitura foi e é fundamental para todos os escritores. Quando comecei a escrever tinha a voz de todos os autores que já havia lido. Hoje percebo que tenho meu próprio estilo, mas sempre há a influência de tudo o que li e ainda lerei.

Consegue viver de literatura

Brendda: Infelizmente não. Gostaria que este fosse meu único labor e também meu sustento.

Em um post de lançamento do seu livro no site midialivre.com foi dito sobre seu livro: “... servir como um farol para reflexões profundas sobre a existência e a saúde mental”. Qual a importância dessa obra justamente no mês da conscientização sobre o suicídio, o Janeiro branco? 

Brendda: (Já estamos em fevereiro)

Qual a maior dificuldade que encontra para chegar ao público leitor? 

Brendda: A divulgação, pois a mídia ou a grande mídia não dá espaço para autores independentes como eu, que não tenho uma editora.

Quais são suas referências literárias? 

Brendda: São muitas, pois sou uma leitora voraz. Citarei alguns, mas não todos. Escritores(as) brasileiros(as) eu leio muito Vinicius de Moraes, Drummond, Bandeira, Quintana, Caio Fernando Abreu, Lispector, Cecilia Meireles, Ana Cristina César e Hilda Hilst. Estrangeiros eu amo Baudelaire, Rimbaud, Maiakovsk, Bukowski, Fernando Pessoa, Dostoievski, Sylvia Plath e Jane Austen.

Há muito de você Brendda pessoa física nas páginas de seu novo livro ‘Poeta no divã’, podemos dizer que é uma autoficção/autobiografia de Brendda Neves na forma de seu eu lírico? 

Brendda: Sim, é autobiográfico. Mas meu editor, por ser mais profissional do que eu, disse que autorretrato é mais poético por se tratar de um livro de poesia.


"Não há como mudar se não se conhecer. Quando você não sabe falar o que sente, e eu não sei falar, escrever é ferramenta poderosa de cura.
Brendda Neves


Lida bem com as críticas? 

Brendda: Não, nunca. Mas de uns tempos pra cá tenho aprendido a escutar sem esbravejar. Agradeço a análise e minha analista por isso. (Risos).

“Acredito que a poesia é uma ferramenta poderosa para o autoconhecimento e a transformação pessoal”, você disse em uma entrevista recente a respeito de seu novo livro e dos poemas nele. Qual a importância da escrita – hoje dita terapêutica - na sua vida pessoal? 

Brendda: Não há como mudar se não se conhecer. Quando você não sabe falar o que sente, e eu não sei falar, escrever é ferramenta poderosa de cura.


O que seria de sua vida sem as letras? 

Brendda: Eu não seria eu. Não seria esta com quem você conversa agora. Eu sou formada por palavras, e pela palavra escrita, não falada. Às vezes até sonho que estou escrevendo uma poesia, então acordo e co sigo ainda rascunhar alguns versos.

Você como jornalista, a algum tempo no meio literário capixaba e conhecendo um pouco da mecânica do mercado livreiro local, escolheu uma editora do Pará para a publicação do ‘Poeta no divã’. Queria saber o quão difícil é publicar no seu estado e o porquê dessa decisão? Eu, particularmente, vejo uma crescente de publicações das pequenas editoras e das independentes, e uma quantidade maior de publicações a nível nacional. 

Brendda: A Folheando é uma pequena editora independente de Belém do Pará e procura sempre descobrir novos talentos. O meio artístico capixaba e suas editoras são cheias de panelinhas, já desisti de publicar por aqui. Já as grandes editoras só publicam autores de renome e eu estou um pouco longe disso.

Dê uma (ou mais) dica(s) para quem quer ser escritor: 

Brendda: Eu só posso dar uma dica: leia. E leia muito, leia de tudo, todos os gêneros e estilos. Mas ser escritor não é algo que a gente decide um dia e fala: vou escrever. É um chamado. Ou você é ou não é. Não gaste seu dinheiro fazendo cursos para ser escritor, gaste comprando livros primeiro.








Brendda Neves é Jornalista, poeta e escritora. Natural de Linhares/ES (1979), é membro da Academia Feminina Espírito-santense de Letras (AFESL), da Academia Internacional de Literatura Brasileira (AILB) e da Associação Capixaba de Escritores (ACE). Fez parte
da Academia Jovem Espírito-santense de Letras (AJEL).

sábado, 3 de fevereiro de 2024

🏳️‍⚧️ “e se eu fosse…” [RESENHA] 🏳️‍⚧️

 

E se eu fosse put@ de Amara Moira (Editora Hoo, 2018)



“Hoje já nem sei mais se me prostituo pra escrever ou se escrevo pra me prostituir, essa é a verdade.” - Pág. 107

‘E se eu fosse put@‘ é a biografia da travesti escritora Amara Moira, nascida em seu blog e transformado em livro físico em 2016 que ganhou essa edição revisada e atualizada pela Hoo editora (2018).

“[…] escrever sobre a rua ao mesmo tempo que a vivo, essa agora tão minha[…] Essa onde eu era livre.” - Pág. 34

Seus textos são repletos de chamadas engraçadas, o que acaba tornando leve os duros relatos de uma vida nas calçadas da noite fria de São Paulo.

“O “NÃO É NÃO” das feministas precisa urgente ganhar a zona, empoderar prostitutas. Os clientes parece que jamais ouviram nada a respeito.” - Pág. 105

A narradora-personagem troca uma ideia sincera com o leitor, Amara e seus causos íntimos se aproxima de quem a lê, tornando uma leitura fluida e gostosa, muitas vezes com um final cômico.

“[…]homens mortos não estupr@m[…]” - Pág. 103

Uma política de controle de todo e qualquer corpo ‘feminino’ além da criminalização do trabalho prestado por essas mulheres e a desvalorização dos seus serviços são temas retratados de forma corriqueira no livro.

“Vejo trabalhadores recém-saídos das fábricas, das construções, virem requisitar meus serviços por vinte, trinta reais, antes de voltar pra casa, pra família, eu sendo a recompensa pelo dia extenuante[…]” - Pág. 124

Um dos meus capítulos favoritos é o ‘ah, se não houvesse riscos!’ onde a escritora fala sobre o estigma da profissão, tecendo críticas ao fundamentalismo e as feministas radicais no campo da política brasileira na luta contra os direitos das profissionais do sexo.

“Por um mundo onde não seja preciso coragem nem desconstrução para amar uma travesti.” - Pág. 178