"a-maior-função-do-homem-no-mundo-é-transformar-se-em--literatura" - Reinaldo Santos Neves

domingo, 21 de julho de 2024

Duas novas apostas à literatura feita no ES

 A literatura na capital Vitória foi movimentada por estes dois lançamentos




Carla Guerson e Reyan lançaram seus livros esta semana

A autora Carla Guerson (@carlaguerson) lançou seu primeiro romance “Todo mundo tem mãe, Catarina”, publicado pela editora Reformatório, no dia 20 de julho, as 16h, no Sesc Glória (@sescgloria), Centro de Vitória, capital do Espírito Santo. A autora ainda tem eventos de lançamentos previstos no Rio de Janeiro, em agosto, e em Salvador, em setembro. O bate-papo sobre a obra foi mediado pela escritora e jornalista Lívia Corbellari.


No livro, Carla desenvolve a história de Catarina, uma garota de 14 anos que começa a sua jornada pelas descobertas da adolescência após uma infância marcada pela falta de pai e mãe. Criada pela avó, uma servente de condomínio de classe média no interior do Espírito Santo, a personagem precisa desvendar a história familiar complexa e cheia de segredos para crescer. Em meio à essa jornada, a garota se depara com temas complexos como prostituição, religião, sexualidade, diferenças de classes e as escolhas que ela precisa fazer.


O livro possui textos de apoio assinados por autoras reconhecidas no mercado literário: a orelha foi escrita por Marcela Dantés, finalista do Prêmio Jabuti 2021 e do Prêmio São Paulo nos anos de 2021 e 2023, semifinalista do Prêmio Oceanos 2017 e autora dos livros “Nem sinal de Asas” e “João Maria Matilde”. Já a quarta capa é de autoria de Débora Ferraz, escritora vencedora do Prêmio Sesc de Literatura em 2014 e Prêmio São Paulo de Literatura em 2015.


Já Reyan Perovano, lançou na quarta-feira (17), seu primeiro livro no Espaço Cultural Thelema, no Centro de Vitória. O lançamento aconteceu três dias após o Dia Internacional da Pessoa Não-Binária, que é celebrado anualmente no dia 14 de julho. O evento contou com uma programação cultural, com espaço para DJ, sarau de poesias, criação de desenhos com o público e bate-papo com Reyan, que é escritora e também ilustradora da obra.


Nil é uma carta escrita para uma criança que sente muito e que às vezes não sente nada. Nil é uma criança preciosa, de um jeito frágil e muito bonito. É uma criança que cresce sem se ver no mundo em que habita e passa, assim, a buscar uma travessia para que seja possível florescer.

Com frases curtas, um enredo riquíssimo e ilustrações feitas com giz, o livro conta uma história cativante e muito gostosa de ler. Segundo Reyan “O giz é um material que considero bruto e sensível. Emula emoções e é difícil de deixar polido. Me interessa muito mais o que é possível sentir”. No livro, alguns trechos da história de Nil são contados por meio das ilustrações, sem o uso de palavras. Essa costura delicada entre palavras e desenhos é feita de maneira brilhante pela autora, dando uma fluidez impressionante para a leitura.


Eu tive o prazer de estar nos dois lançamentos e é um misto de prazer e reconhecimento dessa importante ferramenta de conexão entre pessoas, tão diversas e plurais, em gêneros totalmente diferentes. Livros que, em suas diferenças, nos tocam em nossas humanidades. 
Sem dúvida obras que só vem para agregar no mercado literário capixaba, tão rico e marcante. Ansioso por cada leitura.


Sobre as autoras


Carla Guerson nasceu e vive em Vitória, no Espírito Santo. Formada em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo, escreve em verso e prosa e é autora do livro de contos “O som do tapa”, publicado pela editora Patuá. Também escreveu o livro de poesia premiado pelo edital de cultura da Secretaria de Cultura do Espírito Santo (Secult/ES) e publicado pela editora Pedregulho “Fogo de Palha”. Ela é mediadora de clubes do livro, comanda o podcast “Você, Personagem” e idealizou e coordena o Coletivo Escreviventes, que hoje agrega mais de 600 escritoras de todo o Brasil.

Reyan é artista. Transita, desenha, escreve, experimenta, tatua. Nasceu em Vitória e vive em Cariacica. É mestra em Artes pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), bacharel e licenciada em Artes Visuais/Plásticas, finalista em pós-graduação de Arteterapia, iniciante em técnico de Artes Dramáticas/Teatro. Pesquisa contextos sociais, filosóficos e políticos de gênero, sexualidade, racialização e classe e seus atravessamentos nas artes e suas linguagens.

Outras resenhas:



Espero que tenha gostado, nos vemos em breve

Até!


terça-feira, 2 de julho de 2024

EU, travesti [RESENHA]

 

Eu, travesti: Memórias de Luísa Marilac e Nana Queiroz (Editora Record, 2019)



“— E teve boatos que eu ainda estava na pior. Se isso é estar na pior, PORRAM! O que quer dizer tá bem, né?” - Pág. 168

O livro de Luiza e Nana é um escândalo! Nele as autoras escancaram a noite, fetiches estranhos de homens ‘héteros’ e, é claro, a vida das travestis que fazem seus pontos nas calçadas pelo país.

“Mas antes de ser travesti e de ser puta, eu fui criança como todo mundo. E eu tinha um corpo que não era nem de menino, nem de menina. Era só um corpo de gente. Um corpo todo.
Corpo de criança não tem rótulo ou sessão.” - Pág. 23

A heteronormatividade em xeque. É o que este livro me mostrou. Além da história de uma das ativistas pelos direitos LGBTQIAP+ no Brasil, uma das mais relevantes e sinceras.

“Ocó foi a primeira palavra que aprendi. Significa homem. Mapô é mulher, bofe é homem também. Neca é o pinto, edi é ânus e aquendar é dar, ou esconder, disfarçar - porque a gente aprende as coisas que importam primeiro.” - Pág. 44

O que mais me cativou neste ‘EU, travesti’ foi o fato de ser um papo limpo, direto e reto com Marilac. Me senti de frente para ela, conversando com uma amiga, que confidencia sua vida como um livro escancarado.

“No Brasil e na maioria dos países que fornecem dados à ONU sobre tráfico não existe treinamento de pessoal para contabilizar cabeças de quem não deveria existir socialmente. Sumimos, invisibilizadas nas estatísticas.” - Pág. 97

Como se já não bastassem os preconceitos sofridos, o texto é carregado de agressões físicas, psicológicas, tráfico sexual, exploração, etc. O pior dos lados do desejo ‘humano’.

“Todas nós tínhamos um prêmio sobre a cabeça. Éramos todas marcadas pra morrer por sermos abominações sociais.” - Pág. 121

É um livro curto, mas pesado, seus capítulos breve são um pedido de suspiro que você, leitora deve fazer. São eles que tornam a leitura fluida e um pouco mais leve.

“A felicidade tem a teimosia de brotar de coisas podres e desajustadas.” - Pág. 35