“A memória tem um olfato memorável.” - Págs. 30/31
Lygia, a autora que driblou a censura e mesmo assim escancarou os horrores da ditadura no Brasil publicando seu livro As meninas.
“Os intelectuais estão comovidos demais pra falar, só ficam sacudindo a cabeça e bebendo[…] Eurico continua sumido, foi preso assim que desembarcou e até agora ninguém sabe dele.” - Pág. 22
Em ‘As meninas’ somos guiados, capítulo a capítulo, pelas amigas Lorena, Ana Clara (ou Ana turva) e Lia (a Lião) que vivem no pensionato de freiras Nossa Senhora de Fátima.
“Bom tempo para fazer amor mas não revolução que calor muito forte em subdesenvolvido, amolece. Desfibra.” - Pág. 93
Mesmo sabendo que a autora ganhou o Prêmio Camões (2005) e já foi até indicada ao Prêmio Nobel de Literatura eu ainda não tinha me arriscado a lê-la, e foi um belo começo.
“[…] a forma mais rápida de matar o índio brasileiro é tentar civilizá-lo.” - Pág. 105
‘As meninas’ é um romance denso, principalmente pelo foco narrativo - a forma magistral como Lygia escreve -, onde cada personagem em suas diversas camadas remonta uma parte da história.
“[…] falar em subdesenvolvimento não é só falar nas crianças, depois dou o número exato das que morrem por dia. Tem o analfabetismo. A multiplicação das favelas. Os Retirantes, dê um passeio pelas rodoviárias, escute o que essa gente fala. Vendedores ambulantes com pentes, lápis, giletes. O lixo estourando nas ruas, como se chamam essas bocas que se abre entupidas nas calçadas? A sujeira dos cafés, restaurantes, privadas, a sujeira apoteótica dessas privadas a começar pelas da Faculdade[…]” - Pág. 124
História esta que se entrelaça com a literatura e a memória de um país.
Segundo o filósofo Paul Ricoeur: “talvez haja crimes que não se devam esquecer, vítimas cujo sofrimento peça menos vingança do que narrativa. Só a vontade de não esquecer pode fazer com que esses crimes não voltem nunca mais”.
capa do filme As Meninas (1995)
“— Essa moda que vocês têm, essa de liberdade. Cismou de andar solta demais e não topo isso[…] Minha filha é moça pobre e lugar de moça pobre é em casa, com o marido, com os filhos.” - Págs. 206/207
‘As meninas’ é um registro histórico e foi isso que o tornou pra mim um livro indispensável, singular por suas personalidades e sobretudo por que expõe as cicatrizes de um povo.
Li com o clube de leitura da @enquantoissoleio, estava criando coragem para fazer-lo, e felizmente tive uma ótima experiência com a leitura.
“Você tem que viver sua vida ao seu modo e não do modo que os outros decidirem, ô, Lena, Lena, não sei explicar, mas aquela história do Tempo devorando os filhos, não é o deus Cronos? Ele mesmo ia parindo e ele mesmo ia devorando tudo.” - Pág. 241
E você, já leu As meninas ou algum outro livro da Lygia?
Me conta.
Espero nos vermos em breve,
Até lá!
Obs. este é um livro complexo, para releituras, por isso vai continuar na minha estante.
Ótima resenha. Obrigada.
ResponderExcluirEu que agradeço pela apreciação, querida Mara!
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