"a-maior-função-do-homem-no-mundo-é-transformar-se-em--literatura" - Reinaldo Santos Neves

quinta-feira, 7 de abril de 2022

Entrevistando Contemporâneos & Independentes - Ana Luiza França

 



Como a literatura entrou em sua vida?

A: Nossa…não sei dizer exatamente. Lembro de gostar muito de ouvir histórias quando criança e de antes de aprender a ler, saber exatamente quais eram as palavras escritas. Como eu queria que contassem os mesmos títulos repetidamente, às vezes a minha avó usava as palavras dela e eu interrompia dizendo que “não era assim” e, em seguida, dizia a frase original. Alguns livros da infância eu guardo e revisito até hoje. Pensando agora, acho que a literatura entrou na minha vida no momento em que me apaixonei pelas palavras, pelos sentidos que se escondem nelas; e isso aconteceu bem cedo.



Qual foi o papel da leitura para a construção do seu eu autor?

A: Vejo a leitura e a escrita como formas de dialogar com o mundo. Às vezes você tende mais para uma ou para outra, mas ambas nos colocam nesse diálogo. Na adolescência acho que o que eu mais lia eram poemas. Depois que comecei a publicar os poemas que escrevo, já com 33 anos, minha mãe encontrou uns versos que fiz, e pela minha letra, quando ainda estava no processo de alfabetização. Sempre conto isso para ilustrar como desde bem jovem eu sou encantada pela poesia, e foi justamente por ela que comecei a me entender como escritora. Mas creio que qualquer forma de leitura do mundo, ainda que não passe pela palavra escrita, pode te levar para um lugar de autoria, ainda que também não passe pela palavra escrita.


Consegue viver de literatura?

A: Eu vivo do meu trabalho com arte, não exclusivamente de literatura - isso em todos os sentidos. Quando iniciei minha trajetória profissional não via a literatura como uma possibilidade. Minha atuação até 2018 era só no teatro, área em que me formei. Atualmente parte da minha renda vem do meu livro independente e da Oficina Palavra Franca de Escrita Criativa. Outra parte permanece vindo das atividades como professora de Teatro e de Artes, como atriz, produtora, contadora de histórias, dramaturga…Eu perdi a referência, mas lembrei de um texto enviado por uma amiga que dizia que, para além do trânsito entre as áreas artísticas que nasce da própria imbricação que há entre elas, viver de arte no Brasil costuma demandar que transitemos entre funções por questões econômicas, especialmente no caso de uma artista mulher.


Qual a maior dificuldade que encontra para chegar ao público leitor?

A: Sendo uma artista independente, essa é uma parte complicada. Eu comecei a publicar meus poemas no Instagram e a maioria das pessoas que leem o que eu escrevo chegou por ali. A internet, de modo geral, teve um papel importante no sentido de democratizar, em alguma medida, a fruição da produção cultural. Há 20 anos, se você não conseguisse uma editora que quisesse te publicar, ninguém leria o que você escreve. Ainda que seja uma forma de leitura mais dinâmica, hoje é possível alcançar o público por meio das redes sociais, e isso foi uma mudança gigante. No entanto, as mesmas redes têm restringido a entrega das postagens que não são feitas através de anúncios pagos…há toda uma lógica dos algoritmos que pode se tornar um entrave na hora de divulgar o conteúdo que produzimos. Meu primeiro livro foi lançado de forma independente, com apoio de um edital de fomento às artes da cidade em que vivo e sigo trabalhando para que ele chegue às pessoas. As dificuldades na distribuição dos bens culturais podem se revelar tão grandes quanto as das etapas de produção.


Quais são suas referências literárias?

A: São muitas, mas hoje quero citar a Isabella Mariano, uma escritora talentosíssima aí do Espírito Santo.


Lida bem com as críticas?

A: Hoje em dia acho que sim. O que é feito com respeito a gente tende a digerir em algum momento.


Está trabalhando em algum livro no momento?

A: Como disse antes, sigo priorizando a divulgação do meu primeiro livro, “No Ventre do Mundo", que foi publicado em dezembro de 2020. Em relação a novos projetos, eu vou desenvolvendo e guardando ideias até ter uma oportunidade para tirá-las do papel - ou para colocá-las rs. Nesse sentido, estou, mas de forma planejada e organizada, ainda não.


O que seria de sua vida sem as letras?

A: Ah, não seria a minha vida, seria outra. As palavras me salvam.


Dê uma (ou mais) dica(s) para quem quer ser escritor:

A: Eu ainda sou uma novata como escritora, mas da minha experiência como artista que vem desde o teatro, acho interessante ter em mente que toda área tem particularidades, tem ônus e bônus. Sabendo que você deseja o bônus, procurar entender qual é o ônus. E não ter medo da experiência; escrever é abrir o mundo e abrir-se para o mundo com suas palavras.



Ana Luiza França é atriz, contadora de histórias, poeta, dramaturga, produtora e professora de Artes e Teatro para crianças. Cursou graduação e mestrado em Artes Cênicas na UNIRIO, graduação em Produção Cultural na UFF e licenciatura em Artes na UCAM. Foi responsável pela coordenação editorial de seu primeiro livro, “No Ventre do Mundo”, lançado em dezembro de 2020. Com uma equipe formada por mulheres, a publicação foi selecionada no Edital de Fomento às Artes, promovido pela SMC de Niterói. Escreveu o texto e as canções de “Quem disse? – teatro feminista para crianças”, espetáculo em que também atua. Realiza a Oficina Palavra Franca de Escrita Criativa, voltada para mulheres. Em seu perfil @palavrafranca, no Instagram, publica os poemas que escreve, contações de histórias e informações sobre seus trabalhos.

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