"a-maior-função-do-homem-no-mundo-é-transformar-se-em--literatura" - Reinaldo Santos Neves

quinta-feira, 7 de abril de 2022

Entrevistando Contemporâneos & Independentes - Thainá Carvalho

 



Como a literatura entrou em sua vida?


Bom, eu comecei a ler graças a gibis que meus pais assinavam pra mim. Quando eu era criança, não ia pra lugar nenhum sem levar uma pilha de gibis para ficar lendo. Depois, fui fazendo a transição para clássicos como Meu pé de laranja-lima, A fantástica fábrica de chocolate, entre outros. Aos 14 anos, veio aquela vontade imensa de imitar minha irmã mais velha que passava as madrugadas lendo. Aos poucos, não demorou para que a conta de energia aumentasse lá em casa com duas adolescentes lendo até as 5 da manhã.

Qual foi o papel da leitura para a construção do seu eu autor?

Essencial, mas teve prós e contras. Claro que a leitura me fez ter vontade de ser como os escritores que eu acompanhava. Eu me perguntava “meu Deus, de onde Tolkien tira essas loucuras? Queria ter essa imaginação”. A leitura é essencial para nos dar referências e inspirações enquanto escritores. Por outro lado, há uma espécie de culto à genialidade no mundo literário acadêmico, que se soma àquela nossa velha síndrome de impostor, e nos faz pensar “nossa, eu nunca vou escrever como Clarice”. Por muito tempo, jamais pensei em escrever a sério porque me imaginava incapaz de escrever algo bom. Eu não me sentia genial ou com um dote especial. Por isso, acho muito importante que a leitura seja trabalhada junto aos jovens como um produto do estudo e da prática, algo possível de ser alcançado com referências literárias contemporâneas e acessíveis.

Consegue viver de literatura?

Não. Sou servidora pública e todo o meu trabalho relacionado à literatura é desenvolvido no meu tempo vago. Pretendo transicionar paulatinamente para uma vida financeira que envolva apenas a literatura, mas sei que isso não é fácil.

Qual a maior dificuldade que encontra para chegar ao público leitor?

Na verdade, não penso muito nisso. Claro que já tive uma fase meio obsessiva por leitores e seguidores nas redes sociais. Acho que o instagram e a política de curtidas acaba entrando na cabeça da gente, e pra mim essa é uma rede social muito importante na divulgação dos meus escritos. Mas considerando que não dependo financeiramente da literatura – e compreendo isso como um privilégio no cenário econômico em que vivemos – posso focar mais naquilo que de fato eu gosto e sinto que tenho que escrever.

Quais são suas referências literárias?

Tenho meus olhos sempre voltados para a literatura contemporânea criada por mulheres. Embora poetas emblemáticas como Hilda Hilst e Jacinta Passos sejam inspiradoras, confesso que tenho referências muito fortes em poetas atuais como Mell Renault, Matilde Campilho, Monique Malcher e Júlia de Carvalho Hansen.

Lida bem com as críticas?

Sim. Acho que ninguém pode crescer e melhorar seu desempenho em algo sem saber receber críticas. Toda crítica ao meu trabalho é bem-vinda e, mesmo não concordando com uma ou outra, a discussão em torno daquilo que é criticado sempre traz autoconhecimento. Não é uma questão de aceitar a crítica, mas de pensar a crítica.

Está trabalhando em algum livro no momento?

Sim! Já tenho meu próximo livro de poesias pronto, mas estou trabalhando em uma zine artesanal que será uma espécie de prefácio à obra. Pretendo disponibilizá-la digitalmente de forma gratuita este ano.

O que seria de sua vida sem as letras?

Poderia responder essa pergunta com uma frase de efeito ou um aforismo exageradamente poético, mas a verdade é bem mais simples: seria chata demais.

Dê uma (ou mais) dica(s) para quem quer ser escritor:

Prática. Não há uma musa mágica ou um golpe de genialidade que vai te fazer escrever bem. Minha poesia só começou a melhorar de fato quando me propus a escrever pelo menos dois poemas, bons ou ruins, diariamente. Leitura, estudo e prática. Também é importante não deixar que tudo isso seja influenciado em excesso pela recepção de

leitores. Divulgando nossos escritos na internet, percebemos certas tendências como escrever textos mais curtos ou com um teor mais autoajuda, porque acabam tendo mais alcance. Se isso for o que você quer escrever, siga esse caminho. Se não for, não se intimide e não mude suas verdadeiras palavras. O seu leitor está aí em algum lugar e você vai encontrá-lo.





Thainá Carvalho é uma escritora e colagista sergipana de 30 anos formada em Comunicação Social. É criadora e editora da Revista Desvario, uma publicação digital sem fins lucrativos voltada à difusão da literatura contemporânea criada por mulheres. Publicou de forma independente o ebook gratuito ‘Síndromes’, de prosa poética, e lançou o livro de poesias ‘As coisas andam meio desalmadas’ (Penalux, 2020). Já publicou em revistas e portais como Revista Aboio, Portal Não Me Kahlo, Toró Editorial, Ruído Manifesto, Alcateia e A Estranhamente. É coorganizadora do Sarauema e idealizadora do projeto sem fins lucrativos ‘Vai que Cola’, voltado à causa animal. Atua como curadora e revisora literária.

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