"a-maior-função-do-homem-no-mundo-é-transformar-se-em--literatura" - Reinaldo Santos Neves

sábado, 1 de abril de 2023

Mais uma riqueza explorada (RESENHA)

 



“[…] decidi que este lugar é podre até a medula. Quero cair fora.” - Pág. 135

Este livro foi o primeiro de autoria norte-americana que eu li em 2023, livro esse que ampliou minha visão sobre o domínio americano pelo mundo, sobretudo em um país como Porto Rico: pouco conhecido e estudado por aqui.

“Havia algo de estranho e irreal em toda atmosfera daquele mundo onde eu acabara indo parar. Era divertido e ao mesmo tempo vagamente depressivo. Ali estava eu[…] correndo por uma cidade semilatina[…] e tudo acontecia na velha e fascinante ilha de Porto Rico, onde todos gastavam dólares americanos, dirigiam carros americanos e ficavam sentados ao redor de roletas, fingindo estar em Casablanca.” - Pág. 60/61

No livro acompanhamos Paul Kemp, alter-ego do escritor Hunter S. Thompson, um jornalista enviado dos Estados Unidos para trabalhar em um jornal a beira da falência em Porto Rico.

“[…] o Departamento de Estado dos EUA chamava Porto Rico de propaganda dos Estados Unidos no Caribe - a prova viva de que o capitalismo pode funcionar na América Latina.” - Pág. 92

Ao chegar em Porto Rico Paul se vê em meio à uma crise - que afeta diretamente o poder de compra do povo já que a inflação dos impostos em Porto Rico está altíssimo -, além de que o mote do romance é a “industrialização” e o crescimento hoteleiro no local, sobretudo de empresas norte-americanas “colonizando“ mais uma ilha onde descobriu-se o poder de sua extensão de terra.

“Se eu fosse você, ficaria longe da cidade. Os nativos ficam meio enlouquecidos. As melhores festas acontecem nos barcos. A turma dos iates faz seu próprio carnaval.” - Pág. 154

Só pra contextualizar, Hunter Thompson escreve um estilo de literatura inventada por ele chamada ‘gonzo', onde o repórter (o que ele foi por muito tempo na vida) vive a sua própria reportagem. Vemos em ‘Rum: diário de um jornalista bêbado’ a influência desse conceito o que torna uma viagem muito pessoal, apesar de fatos históricos estarem permeando todo o texto; o autor trabalha muito bem a estrutura da ficção diferente do freestyle dos textos gonzo.

“Passei praticamente o dia inteiro na biblioteca, fazendo anotações sobre antigas investigações anticomunistas[…]” - Pág. 214

Os temas mais recorrentes no livro são a pobreza, o controle da mídia, da moeda, animalização dos ‘nativos’, racismo do povo porto-riquenho e o discurso anticomunismo pesado.

“Quando o sol ficava realmente escaldante, queimava completamente todas as ilusões, e eu enxergava o lugar como ele era - vulgar, triste e berrante. Nada de bom poderia acontecer por lá.” - Pág. 237

O que eu mais gostei no livro, além das personagens e da boa narrativa - um texto fluido - foi enxergar que o povo não cedeu ao Inglês. Que a única coisa que os americanos não conseguiram colonizar em Porto Rico, a coisa mais significativa e simbólica da luta de um povo ao meu ver, foi a língua deles.

“Que direito você tem de vir até aqui, causar um tumulto e exigir que falemos sua língua?” - Pág. 113


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